Sunday 6 April 2014

¿Quão arrogante é a sua humildade?

Pensava que ser humilde é reconhecer os próprios erros e defeitos e não ostentar o que se tem. Mas esse reconhecimento é pura honestidade connosco e com os outros, bem como a ostentação. Se trabalhei anos para ter um apartamento com uma decoração que expõe o meu amor pela arte e mostro-o aos meus amigos, ¿estou a ser arrogante? ¿Ou estou a dar um exemplo de perseguição de sonhos e a partilhar o meu gosto pela arte, esperando que eles usufruam igualmente dela?

¿Como posso esconder os talentos que me foram dados, apenas porque a sociedade – feita de pessoas com outros talentos – lhe atribuiu um sentido negativo ou soberbo? As ditaduras criam seres iguais e extremamente limitados em termos de originalidade e nós alimentamos essas ditaduras sempre que criticamos o diferente simplesmente por não ser como nós. Ou pior, por ousar expor essa diferença, mesmo quando ela pode ser-nos útil, quando muitas vezes somos movidos pelo receio de explorar os nossos dons.

¿Até que ponto a sua humildade foi criada por si ou pela sociedade? ¿Até que ponto a sua humildade o faz recusar elogios, quando no fundo sabe que são merecidos? ¿Está a ser justo consigo e com o dom que lhe foi dado, quando rejeita ser elogiado e diminui o valor da obra que fez e para a qual contribuiu imensa gente desde que você nasceu? ¿Porventura, está a fazer da humildade que a sociedade lhe impõe uma ingratidão?

No outro dia, enquanto fazia jogging em Jacarta, não consegui conter as lágrimas ao ver um coxo a empurrar um enorme carro do lixo. Falamos idiomas diferentes, mas a sua alegria e gratidão foram inspiradoras para mim. Senti vergonha  pela pena de mim mesma, que não é mais do que “idolatria”, como diz a Bíblia, e segui caminho. Não liguei à voz interior que me dizia para tentar ajudá-lo quando pudesse e convenci-me de que a compaixão era suficiente.

Dias depois, vi um cego a tentar vender snacks caminhando no meio dos carros em plena avenida. Simplesmente me contentei em ter nascido num país com um sistema de Segurança Social que protege os menos afortunados e segui caminho, mais uma vez, na minha altivez de sortuda.

Na mesma semana, cai num rio malcheiroso e desloquei um osso. Sem conseguir andar e sem direito a sistema de Segurança Social, pedi uma massagem e rezei por um milagre, mas não era suposto obtê-lo.


 
Como sou uma afortunada, acabei por tratar-me num hospital acreditado e aprendi a lição de que a verdadeira humildade é colocar-me sempre abaixo de todos os outros seres. Afinal, nunca sabemos quando tudo muda. A morte pode chegar de forma súbita. Acreditar que somos sortudos por termos nascido com mais oportunidades e que Deus nos pede para fazermos coisas mais importantes do que simplesmente empurrar um carro do lixo é arrogância. Quando mais possibilidades nos são oferecidas, mais responsabilidade temos para assumir.

Porque por mais solidário que o seu ego lhe faça parecer, vai sempre arranjar desculpas ou defender-se dizendo que a partilha de um post nas redes sociais munido de solidariedade é suficiente. Um dia um amigo disse-me que só se pode dar o que se tem. Outrossim, só quando realmente sentir – por vontade própria ou presente, como no meu caso – o que sente o outro, conseguirá apoiá-lo. É daqui que surge o grande propósito do Ramadão: as pessoas alimentarem a sua compaixão por aqueles que não têm água e alimento.

¡Por isso, eu hoje estou grata por ter algo para partilhar! E escrevo não para si, mas para que um dia tenha a sorte de me confortar com estas palavras.

Contudo, se me permite, ¿está consciente de quão grande é a sua responsabilidade? ¿Até onde vai a sua humildade? Ou melhor, até onde vai a sua busca de felicidade? Talvez encontre algumas respostas neste extraordinário vídeo.

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