Monday 5 May 2014

¡Graças a Deus que estou pobre!


Não me interpretem mal. Estou consciente de que faço parte da minoria afortunada, mesmo quando tenho dívidas e uma conta bancária que convida a um acrobático jogo de cintura.

Nasci num país em forma de berço de ouro e, embora agora o berço já não seja de ouro, ainda tenta carregar-me e embalar-me quando a saúde me falha.

Vivo num país em desenvolvimento, com a décima maior economia do mundo, onde existe ouro, mas faltam berços. Se for atropelada, bem posso aconchegar-me no asfalto, pois a pessoa que ousar estender-me a mão sabe que estende também a carteira no hospital e os preços são elevados (ao contrário de produtos como o tabaco, ridiculamente barato).

Na Indonésia, a minha cor de pele persegue-me. Será inútil gritar que o meu país está falido, que me convenci de que arroz é a minha comida preferida e que andar meia hora para poupar 20 cêntimos de transporte reconforta-me, que para alguns serei sempre da família do Tio Patinhas.

O que mais me indigna não são os pedintes, mas sim os viajados, que nunca devem ter saído dos trilhos de turistas e que reagem como se estivesse a exagerar quando digo que não tenho dinheiro para viajar de táxi. Uma pessoa formada não é aquela que aprendeu muito, mas a que transformou o que aprendeu em lições.

Créditos: FreeDigitalPhotos.net / arztsamui
¡À parte isso, ser menos rica ou uma nova pobre tem sido um tesouro para mim! ¡Vejo ao espelho uma pessoa mais feliz e humana!

¿Como poderia saber a importância que tem uma moeda para um pedinte, antes de decidir deixar-lhe os 50 cêntimos que tinha guardado para um pequeno doce?

¿Que ginásio me poderia oferecer melhor emoção do que ver sete crianças a correr comigo e a tentar travar-me o caminho com a beleza da brincadeira mais inocente do mundo, ao fazer jogging no meio da cidade?

¿Que aborrecido teria sido fazer uma viagem de cinco horas num táxi em vez de ganhar um dia de aventuras imemoráveis num autocarro colorido, que avariou no caminho e que parou em vários sítios para colocar mercadorias no topo? ¡Fui co-DJ durante horas e ainda criei várias cumplicidades, apesar da distância linguística!

¿Que oportunidade teria perdido se não me tivesse parecido demasiado dispendioso para a minha carteira apanhar um táxi quando aterrei em Jacarta? ¡Jamais teria conhecido o homem com o sorriso mais lindo do mundo que me ajudou a tentar descobrir um autocarro!

Créditos: FreeDigitalPhotos.net / Jennifer Ellison
¡Quantos amigos já fiz só por andar a pé ou beber café nos sítios mais baratos de Jacarta¡ Espanta-me quando outros estrangeiros dizem que praticamente não têm amigos indonésios. De facto, nunca fiz um único amigo no Starbucks.

De cada vez que um indonésio se apercebe de que realmente nem todos os brancos são abastados e me estende a mão, é a mais bela generosidade e amizade que brota do seu olhar. ¿Que fortuna poderá comprar tal autenticidade? ¿Que quantia poderia levar um jovem que nunca vi a transportar-me gratuitamente na sua mota depois de eu ter caído a um rio imundo, sabendo que teria pela frente sete dias de limpeza, quiçá até desmontar o motor? ¿Que dinheiro poderá comprar as peras e maças que uma amiga veio oferecer-me a casa?

Os indonésios são das pessoas mais solidárias e também das mais felizes do mundo, talvez porque não se deixam controlar tanto pelo medo do amanhã. Mesmo estando proibido ofertar a pedintes, a maioria não liga à legislação e responde apenas que essa atitude é entre eles e o seu Deus.

¡Uma vez um amigo disse-me que só se pode dar aquilo que se tem, mas eu refuto dizendo que é quando se dá aquilo que não se tem que nos tornamos verdadeiramente ricos!

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