Monday 27 October 2014

Verdades contraproducentes


Todos carregamos muitas verdades. Algumas mais realistas do que outras. A maior parte mais hipócritas do que a mente que os produz. Quantas mais verdades colecionamos, mais corremos o risco de escorregar nelas.

Depois de argumentar com grande convicção que devo direcionar os meus rendimentos extra para quem não têm comida,  bastou-me um dia para voltar ao mesmo lugar, horas depois de não ter conseguido resistir a uma promoção de um perfume. Como resultado, não só perdi a face, como, quando a recuperei, ela estava feita num monte de pedaços e foi impossível resolver o quebra-cabeças. As peças já não encaixam e deixaram espaços abertos, como uma cicatriz.

Tal como quem experimentou a dor de levar com uma bola na testa depois de ter desistido do jogo sabe que uma crítica dói ainda mais quando retorna a casa. Talvez por isso, tudo o que criticamos nos outros, mais cedo ou mais tarde, acaba por bater-nos à nossa porta.

Ironicamente, nem sequer a autoria da frase "Só sei que nada sei", comummente atribuída ao filósofo grego Sócrates, é unânime.

Muitas vezes, nivelamos os nossos valores com aquilo que gostamos de apelidar de verdades universais. Mas, como é sabido, o que é universalmente aceite hoje pode  já não o ser amanhã e duas pessoas com duas verdades opostas tanto estar igualmente certas.

"Aprenda com os erros dos outros. Você não consegue viver tempo suficiente para cometer todos por si mesmo”. Esta frase de Eleanor Roosevelt deve ser usada como o açúcar: com moderação. Devemos ser tão rápidos a perceber que um erro na vida de outra pessoa pode ser uma vitória na nossa jornada como  somos a evidenciar a nossa singularidade no mundo.

Se há tantos livros, opiniões, ideologias e até mesmo verdades contraditórias, seguir uma delas será negar as outras? Pegar num guia e aplicá-lo à nossa vida é mais fácil e mais seguro do que tentar ouvir a verdade que brota do mais profundo do nosso ser em cada situação - mesmo quando essa voz nos mantém acordados toda a noite e parece ter uma missão específica de destruir a nossa paz.

A maioria das pessoas preferem abafá-la com "comprimidos" de paz, refugiando-se nos desejos das pessoas que lhe são próximas ou no que é socialmente incentivado, em vez de enveredarem por uma jornada solitária.

Também neste caso, falar de covardia ou de fobia de responsabilidades seria uma mera diversão de ego. Por trás de cada decisão, há uma criança que já atravessou um deserto sozinha, mas que nunca parou de desejar amor e harmonia.

No entanto, um dia você poderá parar e ver que os olhos dessa criança já não brilham. Não haverá qualquer solução estética para resolver o problema. Por isso, é preferível que restaure a sua alma e aprenda a ouvir a sua própria verdade em cada situação. Sim, provavelmente passará a caminhar sozinho com mais frequência, mas os caminhos vão parecer-lhe mais admiráveis e as viagens mais fantásticas.

Siga a sua bússola, como o fã de futebol que segue incansavelmente o repórter televisivo para aparecer sempre em primeiro plano na TV e descubra o que realmente significa a expressão "chegar a casa".

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